“AHA! Estou-te a ver!
Ainda aí continuas?
Santo Deus! Que miséria! Que estupi dez!
Levanta-te!
Agora! Estás a ouvir?
Corpo, ouves-me?”
Se calhar não. Será que não?
Continua ali, estendido no chão.
Está escuro à sua volta
Ele enroscou-se e os braços abraçam os
joelhos,
na ilusão de um abraço
que acabou por não chegar.
“Corpo… Corpo… CORPO!!”
Não reage, não responde,
creio mesmo que não ouve.
Alheou-se.
Pobre corpo abandonado.
“Perdoa-me.
Eu não te podia levar.
Tu estás gasto e és pesado,
só ias atrapalhar”
Mas ele, incapaz de ouvir,
entregou-se à solidão.
Libertou-se da razão e despi u-se do sentir.
Agora é aquilo que ali se vê:
Um corpo só, enroscado, olhos abertos,
vidrados,
fixos num sonho que nunca ninguém sonhou.
São olhos que não choram.
São lábios que não se movem
pois de outros lábios beijaram as lágrimas que
já não correm.
E eu insisto
“Corpo, vens?
Eu sei que te maltratei,
que te abandonei ao sabor do teu desejo.
Teve de ser porque, sabes, tu tinhas um
coração.”
Toco-lhe, dou-lhe um safanão.
“CORPO!
“Levanta-te! Põe-te em pé!”
Ele estremece,
há uma mão que se mexe.
Farrapo de corpo nu.
Frio,
treme, sem conseguir aquecer.
Não há chama no olhar.
Foi um fogo que se apagou
em tantas lágrimas por chorar.
Ali, enroscado no chão,
estendo-lhe a mão.
Para não despertar mágoas, toco-lhe devagar.
“Corpo, Vens?”
E ele vai-se levantar
Um lamento.
Um movimento.
Uma dor a acordar.
Regressar.
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