Os candeeiros da rua estão acesos e nuvens carregadas prometem tempestade. O edifício está quase vazio. Apenas Jorge, sentado à secretária, ouve a mulher à sua frente, com uma expressão condescendente. Faz rabiscos no bloco quadriculado, enquanto a pressão nas têmporas lhe recorda os excessos da noite anterior. A mulher tem uma equimose abaixo do olho esquerdo e um corte no lábio. A voz é fatigada, vazia de emoções. Na sobrancelha vê-se uma falha, fruto de cicatriz antiga. A história é idêntica a centenas de outras que já ouviu. Anos atrás, quando integrara a divisão de investigação criminal da polícia de segurança pública, trazia o coração transbordante dos princípios e ilusões próprios da juventude. Alto, bem constituído, com olhos verdes brilhantes, almejava ser o campeão das donzelas que o mundo maltratava. A inércia do sistema e a burocracia foram-lhe apagando o brilho dos olhos. O whisky apaziguou-lhe a ousadia. Com crescente rancor, foi descobrindo que as delicadas don...
a história de uma t-shirt, em tempos de quarentena