Desenhei-te com uma ponta de grafite quase gasta. Deslizei-a pelo papel granulado como quem passa, leve, os dedos pelo teu corpo, sentindo cada músculo ficar tenso sob a pele. Desenhei-te de memória, sem precisar de olhar-te uma única vez. O realce de cada sombra nas tuas linhas veio do brilho dos meus olhos, nada mais. Desenhei-te os lábios com traços leves, saboreando devagar. Deixei escorregar a grafite como uma carícia pela curva do ombro. Tracei-te o contorno da coxa, tremi na ondulação das costelas. Desenhei-te como quem beija, de olhos fechados, e, com as sensações a pulsarem na garganta, senti o sabor salgado da pele brilhante. Se me debruçar sobre a folha sinto-te o cheiro. Foi o odor que me transpirou das mãos.
a história de uma t-shirt, em tempos de quarentena